capa - black mirror e o gosto musical

A série Black Mirror nos faz refletir sobre vários aspectos da nossa sociedade, incluindo as artes e a formação do gosto musical. Mas o que Black Mirror e gosto musical têm em comum?

Este post vai discutir especificamente sobre o segundo episódio da série, 15 milhões de méritos, e o papel da indústria cultural. Com isso, podemos fazer vários questionamentos, como: será que nosso gosto musical é ditado? Será que conseguimos nos desvencilhar da imposição da mídia?

Antes de começar a ler, tenha em mente que este post terá SPOILER sobre o seriado!

 

Sobre o que é Black Mirror?

Para quem ainda não conhece esse seriado, Black Mirror significa ‘espelho preto’. Isso nada mais é do que as telas das tecnologias, como o celular, a televisão ou o computador. Por isso, todos os episódios da série são questionamentos sobre o uso da tecnologia e o que isso poderá acarretar na nossa sociedade.

Já o episódio 15 milhões de méritos mostra uma comunidade que precisa todos os dias caminhar em uma bicicleta ergométrica para gerar energia. Todas as dependências funcionam com a energia gerada por essas bicicletas.

Além de gerar energia, quando essas pessoas pedalam, elas ganham créditos pelos pontos acumulados. Esses créditos, então, são chamados méritos.

pessoas pedalando bicicleta na série black mirror

O que fazer com 15 milhões de méritos?

Bem, essa é a quantidade que as pessoas precisam conseguir para poder participar de um show de talentos e ter a chance de mudar de vida, de sair de dentro dessa comunidade.

Basicamente, a vida que eles levam lá não é muito agradável, já que todos os dias eles precisam pedalar e consumir programas televisivos. Além disso, todos dormem em um cubículo, muito pequeno mesmo, que mais parece cela! E as paredes destes cubículos são telas gigantes de “televisão”.

cela com paredes de tv - black mirror

Através dos méritos que conquistam, eles podem comprar suas comidas e bebidas, jogos, programas de televisão ou pular comerciais. Parece estranho ter que pagar para pular comercial, não é mesmo?

Porém, toda essa sociedade é baseada em programas de televisão e comerciais que são mostrados em todos os lados a todo tempo. Então, se você não quiser ver alguma coisa, só pagando para pular!

Você pode até pensar que é só fechar os olhos e não assistir, certo? Mas não é o que acontece. Se você fechar os olhos, o sistema sabe que você fechou e emite um barulho que machuca seu ouvido até você abrir e continuar assistindo o programa.

Já deu para entender onde está a imposição da mídia aqui e a relação com a formação do gosto musical, não é mesmo? Todas essas pessoas são obrigadas a consumir o que passa nessas telas. Assim, só pagando para não assistir. Por isso, assistir ou não nem sempre é uma escolha delas.

 

Como é o show de talentos?

O show de talentos é praticamente a única esperança desse pessoal de conseguir sair daquela realidade.

O personagem principal, Bing, já conseguiu acumular esses 15 milhões de méritos. Ele conhece Abi, que canta muito bem, e pensa que ela tem chance de vencer o show de talentos. Por isso, ele cede seus créditos para que ela consiga ir para lá.

show de talento em black mirror

No fim, nem sempre o resultado do show de talentos é o que a pessoa espera. No caso de Abi, os produtores dizem que ela canta bem, mas já existe muita cantora. Assim, eles oferecem para ela participar de um programa pornô. Abi acaba aceitando, pois é a única chance de sair de sua “cela”. Detalhe, ela tinha sido drogada antes de subir ao palco.

De modo geral, percebe-se que a única maneira de sair do sistema é entrando naquilo que alimenta o sistema: os programas de televisão, voltando a alimentar toda a cadeia e continuando dentro de uma prisão. Vale falar que todos esses programas são o que moldam a cultura das pessoas que pedalam.

 

A formação do gosto musical

Assim, como no Black Mirror, a formação do nosso gosto musical (ou qualquer gosto) é influenciado por aquilo que nos é mostrado desde cedo.

Na série, as pessoas presas em suas bicicletas não conhecem outra realidade a não ser aquilo que é mostrado nos programas de TV. Assim, acabam consumindo tudo por osmose e sem conseguir criar senso crítico.

E no mundo real? Bem, quantas vezes você já não ouviu uma música por osmose? Mesmo que você não queira consumir certos estilos musicais, meio que o mundo ao seu redor vai te obrigar a ouvir. Isso porque a música acontece no carro ao lado, no seu vizinho, no mercado. Enfim, tem música em tudo quanto é lugar.

Além disso, a indústria cultural também massifica a produção musical. Aqui no blog, temos um artigo sobre a indústria fonográfica explicando melhor como esse processo acontece e abrindo caminhos para outras reflexões.

Assim, a produção musical acaba ficando bastante homogênea e não há espaço para muitas variações. Para a indústria fonográfica, o interessante é promover a repetição da repetição porque cria um lugar-comum para o ouvinte. Ele reconhece o que está ouvindo e fica em uma zona agradável.

Por exemplo, se um cantor faz um super sucesso, daqui a uma semana todas as produtoras musicais vão querer encontrar um cantor para deixar parecido com aquele que fez sucesso, pois isso vai garantir as vendas.

Por outro lado, quando surge algo que não está dentro do círculo repetitivo, isso soa estranho à população, pois não faz parte do gosto musical dela.

Aliás, sobre essa questão de modelar artistas para serem parecidos, temos outro artigo aqui no blog sobre isso, fazendo uma reflexão da vida de músico a partir do filme La La Land.

 

Reflita sobre a origem do seu gosto musical

Assim, fica a dúvida: por que será que você tem esse gosto musical? O que será que já foi te mostrado pelas mídias ao seu redor? Será que quando não gostamos de algo é porque de fato é ruim ou porque simplesmente é estranho ao nosso universo?

Sobre esses questionamentos, temos outro artigo aqui no blog sobre como se forma um cânone musical, ou seja, quem decide o que é música boa e música ruim. Então, se quiser entender mais esse processo da formação do gosto musical, leia este post!

Contudo, tudo isso que estamos levantando aqui não significa que seu gosto esteja errado e você não tenha o direito de ouvir o que ouve. Esse post é mais para levantar uma reflexão para entender se aquilo foi ditado a você, se você realmente teve chance de fazer escolhas e se a frase ‘eu escuto o que eu quiser’ realmente é verdadeira ou é uma simples ilusão.

Talvez, o que esteja em nossas mãos é nos esforçar para conhecer outros mundos. Por exemplo, é ir procurar hoje uma música que você nunca tenha ouvido e que não seja nada parecida com os estilos musicais que você escuta normalmente.

 

Uma boa notícia: a gente não vive no universo de Black Mirror!

Sim! A gente ainda tem chance de fazer escolhas, mudar de canal, pular comerciais e procurar vários tipos de músicas, filmes, livros em várias plataformas diferentes. A gente não é obrigado a consumir nada como Bing, mas acabamos consumindo certas coisas até por comodismo.

Então, fica a questão: queremos ficar presos nessas celas do Black Mirror em que nós esperamos a TV, rádio etc. nos dizerem o que temos que consumir, ou podemos abrir nossa porta e procurar outros lugares, outras artes, outras músicas, outros mundos?

Claro, não há problema você ouvir ou consumir o que já consome, mas talvez há um problema de só ficar restrito a isso. Pense: quanto mais procurarmos coisas fora da grande mídia, mais conseguiremos apoiar novas artes a surgir, a ganhar força e criar coisas novas.

Então, procure ouvir novas músicas, ver novas artes! Enfim, aumentar nosso leque de conhecimento!

Se você quiser ver esse texto em formato audiovisual, assista ao vídeo abaixo:

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